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Soajo em Notícia

Este blogue pretende ser uma “janela” da Terra para o mundo. Surgiu com a motivação de dar notícias atualizadas de Soajo. Dinamizado por Rosalina Araújo e Armando Brito. Leia-o e divulgue-o.

Soajo em Notícia

Este blogue pretende ser uma “janela” da Terra para o mundo. Surgiu com a motivação de dar notícias atualizadas de Soajo. Dinamizado por Rosalina Araújo e Armando Brito. Leia-o e divulgue-o.

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Desde menino que Virgílio da Costa Araújo teve de “arriscar” para ganhar a vida. Saiu em menino de Soajo rumo à Capital portuguesa, onde aprendeu o ofício de… padeiro. Depois, mudou-se para Paris.

A “aventura” na Cidade Luz tem sido rica em experiências e é delas que Virgílio Araújo fala nesta entrevista feita recentemente em Soajo.

Virgílio Araújo tem 65 anos e é empresário.

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Com que idade saiu de Soajo?

Saí com 11/12 anos. O meu primeiro destino foi o Monte de Caparica, em Lisboa. Como todos os soajeiros na Capital, também eu aprendi a arte de padeiro.

Quem lhe ensinou o ofício?

Tinha lá um padrinho e um irmão mais velho. Trabalhei dos 13 aos 17 como padeiro. À época, tirei a Carteira Profissional de Padeiro que nunca cheguei a levantar…

E depois?

Fui para Paris em finais da década de sessenta. A primeira coisa que fiz em França foi trabalhar nas obras. Mas não correu muito bem (era muito duro trabalhar na construção de casas). Depois, tive um problema com o responsável e fui trabalhar na área de limpezas cerca de dois anos (das 4.00 às 9.30).

Entretanto, o gerente, porque simpatizava comigo, propôs-me umas horas mais na limpeza de paredes. Também fazia outras coisas como pinturas. Entenderam que me “ajeitava” na pintura e dediquei-me mais a isso.

Seguidamente, enveredei pela pintura, numa pequena sociedade, de patrão polaco, ao longo de 16 anos.

Em 1987 (12 de outubro), com 36 anos, formei a minha empresa na área de restauro e decoração de interiores, em casas sobretudo. No início, estava sozinho. Depois, o negócio foi evoluindo e deu-se a expansão até empregar 15 colaboradores. Agora, somos oito.

Disse que foi para França em finais da década de sessenta do século passado. Chegou a viver a Revolução francesa [de maio de 1968]?

Não a vivi por pouco… Cheguei a França em 1969 e a Revolução tinha sido um pouco antes.

E não sentiu os efeitos revolucionários no terreno?

Naquela altura, com 17 anos e meio, não senti nenhuma repercussão. Quando fui para lá, não ligava muito à política.

Dos presidentes franceses que se foram sucedendo, qual o mais “amigo” dos emigrantes?

Acho que François Mitterrand [foi Presidente de maio de 1981 a maio de 1995] fez a diferença a ajudou muito os portugueses clandestinos – ele permitiu a legalização deles. Jacques Chirac [Presidente de maio de 1995 a maio de 2007] também foi importante para os portugueses.

Voltando à sua história de vida empresarial… O que é ser gestor de uma empresa? Que dores de cabeça tem no dia-a-dia?

Muitas dores… Por exemplo, chegar ao fim do mês e ter de haver dinheiro suficiente para pagar despesas certas: salários dos operários, IVA e carga social, que é enorme em França (o dobro da de Portugal, parece-me…). Ou arranjar encomendas para continuar a vingar no mercado.

Quando foi o período auge da sua empresa em termos de encomendas?

Antes da crise, obviamente. Mas durante e depois da crise nunca me faltou trabalho, devo acrescentar. Simplesmente, ao contrário do que sucedia no passado, atualmente, não consigo ter seis a 12 meses de trabalho de avanço.

Porquê?

O setor do restauro e decoração está em crise e há a concorrência desleal dos países de Leste da Europa nestes ramos e noutros afins (pintura e construção). E há muitos portugueses que vão para lá. É a chamada mão-de-obra deslocalizada. A lei francesa proíbe que estes trabalhadores recebam menos do que o salário mínimo desses países de Leste, mas acho que isso não acontece.

Que tipo de trabalho faz na área do restauro e decoração de interiores?

No setor do restauro e decoração de interiores, fazemos coisas lindíssimas, nomeadamente imitações do mármore, da madeira… O nosso mercado tanto poder ser uma habitação como um restaurante.

Como apanhou o “bichinho” pela decoração?

Por contingências da vida e por necessidades do mercado.

Para estar a par dos novos desenvolvimentos técnicos, costuma frequentar ações formativas na área de construção, restauro e decoração de interiores?

Sim… Estive dois anos na Federação Francesa de Bâtiment. Também fui fazendo umas qualificações pelo tempo fora.

Quantos portugueses emprega a sua empresa?

Atualmente, tenho quatro – de Viana do Castelo, Vinhais e Bragança. Há muitos portugueses nesta área, mas no passado éramos mais. As gerações mais novas têm outra formação académica – atualmente, há até jornalistas nos meios audiovisuais.

Visto que passa algumas temporadas em Soajo, como é gerir a empresa à distância?

Antes, só vinha uma vez por ano… No presente, tenho dedicado menos tempo à empresa, pois consigo gerir as coisas de outra maneira, através do i-Pad e do telefone.

Qual o âmbito de abrangência da empresa? A atividade está expandida a todo o território francês?

Não. Trabalhamos somente em Paris e nos arredores da Capital (lado oeste).

Em que medida o negócio vai ter continuidade no seio da família?

O meu filho não está interessado em trabalhar neste setor. Ele preferiu comprar uma oficina.

Quando é que se vai retirar do mundo empresarial?

Em princípio, em 2018. Depois, não faço planos para ficar definitivamente em Soajo. Tenho a vida estabilizada em França e é neste país onde estão os meus cinco netos. Mas também não sou pessoa para planear a longo prazo. Dito isto, tenho possibilidade de viver em Soajo e de viver em Paris, porque tenho casa nos dois sítios. Só peço saúde.

Qual a perceção dos franceses em relação aos trabalhadores portugueses?

Hoje, é um pouco diferente da perceção de tempos idos. Nos anos setenta, era um bocado mais complicado. Nesse tempo, ouvíamos um discurso contra o emigrante português, mas essa questão não se coloca tanto no setor da decoração, porque há poucos franceses a trabalhar no ramo.

Tem algum fundo de verdade a notícia de que há portugueses a passar mal em Paris?

Sim, é um facto. Conheço um caso de um português deslocalizado que teve de receber ajuda financeira para regressar às origens. As novas vagas de emigração não têm grande recetividade, basta ver que a Front National [Frente Nacional, de extrema-direita] conseguiu alcançar a segunda volta das eleições francesas… Ontem como hoje, os emigrantes rumam a outros destinos para governarem a vida deles. A chegada maciça de refugiados à Europa veio alterar a perceção que muita gente tem da emigração.

Tem medo de um dia poder estar no epicentro de um ataque terrorista?

Penso nisso, mas faço a minha vida normalmente. E não é isso que me impede de sair e de pegar no carro para trabalhar. Nunca estive perto de nenhum ataque e, por isso, o medo não está presente no dia-a-dia.

Como acompanha as notícias de Portugal?

Vejo os noticiários da RTP Internacional três ou quatro vezes por semana e é através deste canal que tomo conhecimento de tudo o que se passa em Portugal.

Como olha para Soajo?

[…] Politicamente falando, conto um episódio que aconteceu no último dia de campanha autárquica em Fafe. Os candidatos andaram toda a semana em campanha e a ralhar uns com os outros e, à meia-noite de sexta-feira, beberam um copo todos juntos. Gostava que isso acontecesse também em Soajo.

Defendo que, nas eleições autárquicas, se deve votar nas pessoas, e não nos partidos. Antes de tudo, a competência. Eu voto na pessoa, não voto no emblema. As eleições nacionais, reconheço, são diferentes.

O que está por fazer em Soajo?

Muita coisa… No meu tempo de escola, havia quatro ou cinco turmas, vinte e tal miúdos por classe… Agora, vemos os quarteirões quase vazios. Só vemos gente idosa, pelo que temos de fazer alguma para promover a natalidade e trazer juventude. Mas os jovens ficam aqui a fazer o quê? Há o caso das vindimas, mas as vindimas duram 15 dias, e depois?

Então, está a dizer que não há maneira nem solução para fixar a juventude?

Não vejo absolutamente nada… Não fizemos nada por isso estes anos todos. E, de igual modo, nada se fez a pensar nos idosos. Há vinte anos que estamos a aguardar por um lar que, se existisse, poderia empregar várias pessoas de Soajo.

A partir da sua experiência, o que se poderia fazer para desenvolver economicamente Soajo?  

O desenvolvimento tem de passar pelo turismo. Há muita gente que gosta de Soajo, mas não interessa massificar a nossa terra. Não quero Soajo massificado como o Gerês. Ah, é urgente limpar e cuidar melhor do espaço público.

Claro que o turismo não está explorado na sua plenitude. Precisamos de construir melhores infraestruturas e de oferecer um alojamento mais sofisticado para chegar a outros nichos de mercado, sem prejuízo de reconhecer que as casas [de turismo rural] que existem são lindíssimas. O hotel que está a ser construído na vila de Soajo é um bom investimento…

Fora o turismo, não há mais indústria… E, pelo caminho, perdeu-se a hipótese do centro escolar, assim como da escola de turismo, que iriam trazer um impulso a Soajo. [E também foi encerrado o polo da EPRALIMA em Soajo].

Tenciona investir em Soajo no futuro?

Já investi muito em terras… Tenho duas casas e um terreno. Alguém me disse que sou o maior agricultor de Soajo, mas não cultivo nada!

Voltaria a fazer o mesmo hoje?

Talvez não. Pelo menos, tanto investimento não. Mas não venderei nada.

E investir no turismo de alojamento local não o cativa?

Se tivesse 15 anos a menos, talvez investisse no ramo do alojamento. Tenho terrenos para isso.

Há gente que defende complementos turísticos às lagoas e à serra como campos de golfe e de ténis. O que pensa disso?

Sim, é preciso alargar o mercado. Hoje, quase toda a gente procura o golfe. Acho que um hectare de terreno para essa modalidade chegaria para atrair amantes do golfe.