Realizou-se, no passado dia 22 de junho, mais uma sessão ordinária da Assembleia de Freguesia de Soajo, quase toda ela dominada por temas recorrentes e anomalias por sanar: barraca nas proximidades do Poço das Mantas, "falta de asseio" das casas de banho públicas no Campo da Feira e Loja Interativa de Turismo "encerrada aos fins de semana em plena época alta"… O presidente da Junta (PSD) e a oposição (CDU e MSI) agudizaram, politicamente, divergências antigas, como a seguir se verá com grande detalhe.
Sob proposta da CDU, foram apresentados à mesa um voto de protesto e um voto de louvor, ambos aprovados por unanimidade. O primeiro “repudia o comportamento da empresa de transportes que faz a ligação Soajo-Arcos de Valdevez, pelo prejuízo causados aos alunos e outras pessoas no passado dia 18 de junho (de manhã), ao não providenciar nenhum autocarro para fazer o serviço que lhes competia, com a agravante de, nesse dia, alunos terem exames nacionais, prova de Português, determinante para o percurso escolar deles”, disse a deputada Rosalina Araújo.
Já o voto de louvor congratula “as pessoas da vila de Soajo e, em especial o povo de Vilar de Suente, que se voluntariaram por um Soajo mais limpo no passado dia 15 de junho”. Esperam os subscritores da proposta que “esta ação tenha sido apenas o ponto de partida para outras iniciativas com a mesma finalidade, mas disseminadas a todos os lugares da freguesia de Soajo”.
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Interpelação ao executivo
No período de questionamento da oposição ao executivo, subiram a primeiro plano algumas das questões que têm estado no centro da dialética política desde 2018, a seguir apresentadas de modo esquemático.
Barraca nas imediações do Poço das Mantas
A deputada Rosalina Araújo, acerca da construção que foi embargada, há mais de um ano, no parque de lazer fronteiro ao Poço das Mantas, quis “saber se a obra vai ficar assim, em ruína, ou se, pelo contrário, se avança, finalmente, para uma edificação que dignifique o local”, lembrando aos presentes que, em tempos, “a Junta de Freguesia afixou um Edital, ainda que em local pouco visível (no placard junto ao Multibanco), para concessionar o espaço, só que nessa altura o projeto já tinha sido concessionado ao Clube de Caça e Pesca”, notou.
Na resposta, o presidente da Junta disse “já ter respondido uma vez, em sessão anterior, à pergunta”, recusando, por isso, prestar mais esclarecimentos sobre tal assunto, mas sempre foi dizendo, para visar Cristina Martinho (ausente nesta sessão), que a obra “foi embargada pela presidente do Conselho Diretivo dos Baldios de Soajo”, isto no instante em que a palavra tinha sido pedida por António Cerqueira (“Catito”) para colocar a Assembleia a par dos últimos desenvolvimentos sobre o caso.
“O Clube de Caça e Pesca foi obrigado a fazer uma diligência administrativa no Parque Nacional, e, perante isso, foi-nos dito que a obra, até segunda ordem, não podia avançar. Acatámos a determinação, dirigimo-nos, posteriormente, à Câmara, até que, volvido algum tempo, recebemos autorização do Município para se avançar com a iniciativa, que está entregue a quem já estava entregue”, contou o presidente do Clube.
Segundo António Cerqueira, “a obra já devia ter começado esta semana [semana passada], indo a mesma ser feita com a máxima brevidade”, estando definida a colocação de caixotes do lixo (madeira) e a recolha diária do lixo pelo Clube de Caça”.
De referir que a barraca, sob gestão do Clube de Caça e Pesca (organismo sem fins lucrativos), se destina a prestar apoio aos banhistas na época alta.
Entretanto, apesar da falta de explicações, nesta sessão, sobre o procedimento administrativo relativo à concessão, é bom lembrar que, em junho de 2018, Manuel Barreira da Costa admitira, na altura, “uma certa precipitação no processo”, refugiando-se, no facto, de “apenas o Clube de Caça e Pesca ter concorrido à iniciativa comunicada em Edital”.
Casas de banho no Campo da Feira
À interpelação, feita pela CDU, sobre “quem procede à limpeza das casas de banho” no recinto do Campo da Feira e “quem cuida da abertura e fecho das mesmas”, o presidente da Junta disse que “quem abre e fecha nos dias úteis é o funcionário da Junta” e esse trabalho fica, nos fins de semana, por conta de “uma miúda”, que “também faz o asseio” dos sanitários.
Visivelmente incomodado com a insistência da deputada, que questionou, ainda, o autarca sobre se a Junta “fiscalizava a limpeza das casas de banho”, Manuel Barreira da Costa puxou pela memória para carregar numa linguagem grosseira: “Como, há cerca de 15 anos, disse, aqui, diretamente, a uma pessoa, que me perguntara ‘para onde é que iam as barricas com a porcaria que vinham cá buscar’, também agora a minha posição é esta: não sou fiscal de m- - - -, mas vou ver lá várias vezes, se aquilo está limpo ou não. Umas vezes está melhor, outras pior”, reconheceu.
FAOT
A propósito da Feira das Artes e Ofícios Tradicionais (FAOT), que se realiza de 12 a 14 de julho, a CDU sugeriu a introdução de um momento cultural no programa. “Já que a FAOT é um espaço de promoção de Soajo e dos seus valores, que seja feita a apresentação do livro, A vontade como liberdade de pensamento, do soajeiro Fernando Pires, a exemplo de outras edições da FAOT”, exortou Rosalina Araújo.
Com prudência e sem qualquer posição definitiva, o presidente da Junta deixou em aberto a possibilidade de se inserir a proposta no programa da FAOT, hipótese que será “colocada à ARDAL”.
Quanto à restante programação, esclareceu o presidente da Junta que a FAOT terá, “na mesma, um espaço museu”, sendo que o concurso de gado foi suprimido em 2019. Em compensação, este ano, o concurso de mel será aberto a todos os produtores soajeiros, não certificados incluídos.
Caminhos
No plano dos acessos, a eleita da CDU perguntou se a Junta “tem alguns caminhos em vista para serem intervencionados” e, em caso afirmativo, “quais os materiais a utilizar em cada um deles”.
O presidente da Junta, sem responder à segunda parte da formulação, assegurou que a autarquia está “a cumprir o Plano de Atividades”, questionando, de permeio, o interesse da deputada sobre esta matéria, “quando esta se absteve na respetiva deliberação”.
Em “defesa da honra”, Rosalina Araújo lembrou que a “abstenção no Plano de Atividades (posição justificada com declaração de voto) se deveu ao facto de o documento não mencionar qualquer obra, tudo o que lá constava eram ‘obras diversas’, e, sob esta denominação, até pode caber a demolição do Pelourinho e a sua deslocalização”, atirou.
Enquanto isso, no domínio das pequenas intervenções, a CDU recomendou que se sinalizasse o caminho sem saída nas Fontelas.
“Já o referi, aqui, noutras assembleias, é só fazer o favor de mudar o sinal de sítio (para o outro lado), pois continuamos a ver muitos carros a subir com os correspondestes constrangimentos: os portugueses ainda se desenrascam, mas o mesmo não acontece com os estrangeiros”.
O presidente da Junta sublinhou “ter tomado nota disso”.
Relação com as associações da freguesia
Perguntado sobre se a Junta estava a ter uma “política de ingerência nas associações da freguesia, especialmente nos trabalhos da Casa do Povo”, o presidente da Junta preferiu, primeiro, desmerecer o papel dos deputados, justificando, depois, a posição da autarquia com a necessidade de se fazer bom uso dos dinheiros públicos.
“Acho que vocês não têm nada que ver com isso, a Junta apoia a Casa do Povo e queremos saber como e onde é que o dinheiro vai ser gasto, por isso é que tivemos uma reunião com a Casa do Povo e vamos ter com as demais associações a quem a Junta presta apoio também”.
Equipamentos urbanos
A deputada Rosalina Araújo ilustrou, com fotos, o “mau estado” de papeleiras e floreiras, recomendando que se fizesse “manutenção dos equipamentos urbanos”.
O presidente da Junta mostrou-se conformado com uma realidade imutável. “O Fernando já plantou várias vezes flores e o que acontece é que duram dois ou três dias, o gado come-as e, se não é o gado, são talvez as pessoas que as levam. Lembro que fui eu que mandei colocar as papeleiras na vila, em tempos já tivemos de tirar algumas, e, se calhar, teremos de remover outras, sendo esta uma questão a discutir pelo executivo da Junta, porque, lamentavelmente, as pessoas fazem das papeleiras autênticas lixeiras”, acusou Manuel Barreira da Costa.
Com base nas lições do passado e do presente, a CDU defendeu que, “se do plano de reabilitação do Largo do Eiró constar a colocação de floreiras, e, se a estas for dado o mesmo destino das existentes, então, que se reveja a iniciativa, porque a sua degradação não dignifica em nada a nossa Terra”.
Já no plano das papeleiras, e no seguimento da colocação de um equipamento destes, por um particular, em Bairros (“enclave de Soajo?”), a CDU quis saber se, a partir de agora, a “política de investimento em apetrechos vai funcionar assim, por conta e risco de particulares, […] sem prejuízo do gesto meritório do respetivo morador, mas este trabalho é da competência da Junta”, vincou.
Na resposta, o presidente da Junta disse “louvar o particular que pôs a papeleira” em Bairros, fazendo votos para que “haja no futuro mais pessoas a fazer isso”.
Terminais do lixo
Em tom irónico, Rosalina Araújo deu os “parabéns à Junta pela construção de três terminais de recolha de lixo na Costa Velha, Mina das Aranhas e Campo da Feira.
“[…] Não sei qual deles receberá o primeiro prémio, os três são autênticas aberrações”, acusou a deputada eleita nas listas da CDU, concluindo que, “se todos queremos um Soajo turístico e rústico, então, estamos no caminho errado”. Também o deputado António Brasileiro (MSI) criticou estas “construções, que não dignificam nada a Terra e não estão em consonância com o meio”.
O presidente da Junta rebateu tais pontos de vista. “Achamos que os terminais estão bem, ainda não estão concluídos, pois serão forrados com pedra por fora. E o que está no Campo da Feira nem vai ficar assim, será desmontado, indo a Câmara proceder à sua execução”, adiantou o autarca, sem explicar, no entanto, o motivo por que foi construído este curral provisório, com custos inerentes.
Loja Interativa de Turismo
Sobre o Posto de Turismo, a deputada Manuela Jorge (MSI), no seu legítimo papel de fiscalização, questionou a Junta para certificar se, “no contrato, não constava a abertura da loja aos sábados”. “Há muito turismo em Soajo e as pessoas andam por aí muito desorientadas, pelo que há efetiva necessidade de abrir ao sábado a infraestrutura, eventualmente também ao domingo”, aconselhou.
O presidente da Junta endossou responsabilidades ao Município. “O Posto de Turismo de Soajo é com a Câmara, a Junta não vai pagar a ninguém para estar de serviço ao fim de semana, embora fosse necessário prestar este apoio, de qualquer modo, o Totem no recinto exterior pode desenrascar os turistas, desde que os utilizadores saibam trabalhar com ele”, atalhou o autarca social-democrata.
Mas a deputada do MSI não ficou “satisfeita” com as explicações de Manuel Barreira da Costa, lembrando que, no acordo feito, ficou estipulado a abertura do Posto de Turismo ao sábado, esgrimindo, de seguida, novos argumentos.
“Se esta matéria é, como diz o presidente da Junta, da competência da Câmara, então a Junta, pelo seu presidente, devia articular com o Município para que este disponibilizasse a informação que falta – e que o Totem não desenrasca – sobre trilhos e produtos locais através da abertura do espaço ao fim de semana… Não basta manusear o bonequinho e tirar uma fotografia, porque nós temos muita coisa para mostrar, não apenas o Pelourinho e os espigueiros. Lamento essa resposta do senhor presidente, estamos a fazer destas assembleias grandes palhaçadas, algo que não pode ser”, criticou Manuela Jorge.
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Atividade da Junta
Como determina o Regimento, o presidente da Junta comunicou as diligências, atividades e projetos empreendidos no último trimestre pelo executivo.
. Destacou a participação da Junta no aniversário da Casa dos Arcos em Lisboa, no Festival de Folclore em Vilarinho das Quartas, nas comemorações do Dia Mundial da Criança e na festa de encerramento do ano letivo”, bem como a presença em “vários seminários e sessões de esclarecimento de interesse para a autarquia”.
. A Junta, acompanhada do presidente da Câmara e de uma técnica, deslocou-se a Adrão para “ver a possibilidade de abertura de um caminho até ao lugar, do outro lado da ponte”. Paralelamente, foi promovido um encontro com o presidente do Município para “falar de alguns assuntos pendentes e de interesse”.
. Foi assinado protocolo com a Câmara Municipal e assinada a consignação da obra do arranjo urbanístico do Largo do Eiró, cuja “montagem começará em setembro próximo”.
. Foram “realizadas várias obras de manutenção e limpeza nos lugares”.
. Também se procedeu à “orçamentação das obras do Plano de Atividades e as mesmas foram entregues aos empreiteiros”.
Feita esta breve apresentação, e na continuação de divergências anteriores, os deputados António Brasileiro e Rosalina Araújo carregaram nas tintas para acentuarem o défice de informação sobre os trabalhos a executar pela Junta. “Tendo em conta que o presidente só fala em obras que não especifica e não diz quais, a Assembleia continua sem saber quais são as obras a fazer”, disse Rosalina Araújo.
Na resposta, o presidente alegou que os nomes das obras não foram mencionados no Plano de Atividades porque as designações [que a Câmara atribuiu] não estavam corretas”, aclarando depois que as obras consignadas, recentemente, dizem respeito ao “Caminho dos Pericos, em Vilarinho das Quartas”, ao “Caminho Aqui d’el Rei” e ao “Caminho de Lameira de Antão”, ambos na vila de Soajo.
À pergunta da deputada da CDU se “a Assembleia podia saber quais os materiais a usar nesses caminhos”, o presidente da Junta retorquiu em tom agreste: “Vamos fazer tudo em azulejo”, atirou Manuel Barreira da Costa.
Com espontaneidade, seguiu-se um gracejo do presidente da Mesa da Assembleia, António Enes Domingues – “Fica bonito!” – e uma tentação de Rosalina Araújo – “E se for artístico, e em vermelho, [o azulejo] fica ainda melhor, muito obrigada pela resposta”, ironizou Rosalina Araújo.
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Delegação de competências
Em consonância com a posição da Junta, a Assembleia de Freguesia recusou, por unanimidade, a delegação de competências do Estado Central para a freguesia de Soajo em 2019 e 2020.
Para o presidente da Junta de Freguesia, “não estão reunidas as condições [meios financeiros e recursos humanos] para que a Junta assuma, desde já, as competências previstas no pacote de descentralização. […] E há matérias, como a autorização para se deitar fogo-de-artifício, que devem ser muito bem estudadas”, avisou.
No dizer do presidente da Mesa da Assembleia, “a delegação de competências nos órgãos locais é um bom princípio, […] o problema é que, no atual contexto, não há verbas. Defendo que o Governo Central, ao transferir estas competências, devia informar já as autarquias da verba que tinha para isto, pelo que, enquanto não soubermos objetivamente a respetiva compensação financeira para cada área, temos de rejeitar a proposta”, concordou António Enes Domingues.
Recusada, por enquanto, pelos dois órgãos autárquicos de Soajo, a descentralização será, no entanto, automática e obrigatória em 2021.
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Intervenções do público
No período destinado ao público, Alexandre Araújo Gonçalves reafirmou um “pedido feito ao antigo presidente da Junta, Manuel Gomes Capela, e à atual presidente do Conselho Diretivo dos Baldios de Soajo, Cristina Martinho, sobre o que fazer num troço do Caminho da Portelinha”.
“Queria saber como é que posso arranjar o caminho, que está na proximidade de uma ponte… Por causa da inação, um dia chateei-me e meti lá uma máquina para alagar o Caminho da Cabaninha e logo veio o PN mandar parar tudo”, recordou.
O presidente da Junta foi direto ao assunto. “Trata-se de um caminho que não diz respeito à Junta, mas sim aos Baldios, sendo certo que quem faz uma intervenção num caminho sem ordem do PN incorre em coima bastante grande. É preferível por isso pedir autorização ao PN, articular com os Baldios e, se o senhor Alexandre quiser abrir, acho que os Baldios não o vão proibir, no caso de ser o senhor a fazer a abertura do caminho. Mas tem de obter sempre uma licença do PN”, comunicou Manuel Barreira da Costa.
A respeito de tal assunto, António Cerqueira acrescentou que Alexandre Araújo Gonçalves “apenas reparou um caminho que já existia, nada mais do que isso”.
Por seu lado, Manuel Canto interpelou a Junta sobre a “possibilidade de arranjar o largo do Pedrão, porque há cascalho no chão e, no inverno, o caminho fica intransitável devido à água que se acumula no local. No presente, o problema que existe é que o cascalho está solto e, há dias, um camião projetou uma pedra contra a perna, se me vem à cabeça seria bem pior”, advertiu.
Face ao relato, o presidente da Junta prometeu “incluir a intervenção solicitada no Plano de Atividades para sanar o problema no único largo onde se pode dar a volta no local”.