O número de visitantes do Parque Nacional (PN) tem vindo a crescer nos últimos anos, sendo de longe a área protegida mais procurada do país. Em 2019, visitaram o PN mais de 103 mil pessoas e, este ano, as estatísticas apontam para um número recorde de turistas. Este verão, a vila de Soajo tem sido invadida por grandes contingentes de turistas nacionais.
Apesar de o término de 2020 ainda estar à distância de quase quatro meses, a diretora regional do norte do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) adianta que o aumento considerável de visitantes desde o desconfinamento, coincidindo com o levantamento do estado de emergência por motivo da pandemia da Covid-19, se vai repercutir nas contas finais. “É visível que há uma tendência no acréscimo de visitantes nas áreas protegidas, sobretudo no PN, que, sendo o único do país, se tornou muito atrativo”, justifica Sandra Sarmento.
Os grandes aglomerados de turistas (nacionais), em busca no pós-confinamento de tranquilidade e de espaço livre no meio da natureza, têm suscitado trabalho redobrado aos vigilantes do PN. “A maior parte das visitas concentra-se nestes meses de verão e isso é um problema. O nosso grande desafio é acautelar que as regras são cumpridas e para isso contamos com os nossos vigilantes. Só que este tem sido também o período de risco para os fogos e eles passam o tempo todo a dar apoio na vigilância de incêndios, não há missões alternativas”, sublinha a responsável em declarações ao jornal Público.
O PN, primeira área protegida do país (criada em 1971), que é também Reserva da Biosfera Transfronteiriça, tem sido notícia por abusos recorrentes, como foi o caso recente da área de proteção total da Mata do Ramiscal, devido à prática de todo-o-terreno nos estradões circundantes, situação que levou o ICNF a reforçar a vigilância nesse “tesouro” de biodiversidade.
Mas os relatos de incumprimento das regras no território do PN acentuaram-se muito desde maio com os visitantes ocasionais a mostrarem grande défice de informação. “Chegam cá pessoas que desconhecem o Parque, muitas vezes estão a visitá-lo pela primeira vez e, desconhecendo, não percebem o que está aqui em causa, pelo que, inadvertidamente, o invadem em grandes concentrações. Não é maldade intencional, mas, ao não respeitarem as regras, não veem que podem fazer mal à fauna e à flora, e invadem habitats sensíveis e zonas únicas para algumas espécies”, lamenta Sandra Sarmento.
As situações anómalas mais comuns prendem-se com a “recolha de plantas”, “lixo que é deixado para trás”, “piqueniques com recurso a fogueiras (proibidas)”, “campismo selvagem”, “autocaravanas e veículos estacionados em qualquer sítio”, “caminhadas de grandes grupos sem autorização”, conta Lino Gonçalves, chefe dos vigilantes… Ao invés, quem conhece as regras sabe que há princípios básicos a ter em conta, nomeadamente não colher qualquer espécie de flora, não perturbar a fauna, não fazer lixo (e, se possível, remover os resíduos que forem encontrados), percorrer os trilhos assinalados e desfrutar da natureza sem agredir os valores naturais.
Só que para o visitante comum a experiência não se resume à fruição da paisagem, quem chega a esta área protegida arrisca quase sempre um mergulho nas lagoas rodeadas de cascatas e, neste plano, os poços de água cristalina, em Soajo, estão entre os favoritos. Mas nos desfiladeiros “é preciso que haja sensatez, é […] desaconselhada a prática de banhos nas cascatas”, avisa Duarte Figueiredo, diretor do Departamento de Conservação e Biodiversidade do Norte do ICNF.
O estio de 2020 indica que o público jovem que frequenta as lagoas “aninhadas” nos rochedos não liga muito às recomendações e visita esta área protegida como se fosse a uma praia da orla marítima. “[…] As cascatas não são zonas balneares nem de banhos. Elas existem no PN e são usadas, não há nada a interditar o seu uso, o que acontece é que são usos inadequados. As pessoas andam em cima das rochas, o que é muito perigoso, trazem crianças e calçado que não é adequado. Vêm para aqui como [vão] para a praia, não para o Parque Nacional”, critica Sandra Sarmento.
Restrições nas zonas de proteção total
Os condicionalismos, ignorados por muitos, são lembrados a cada instante pelos vigilantes e constam das brochuras informativas. Nas áreas de proteção total, o acesso é restrito, só possível mediante autorização e em determinadas condições – na área de proteção parcial, tipo I, os passeios a pé só podem ser realizados (sem autorização) por grupos com menos de dez pessoas. Mas, além disso, há zonas de proteção total onde o acesso é completamente vedado para salvaguardar a “continuidade dos valores existentes”, lê-se num dos panfletos do ICNF, em referência, a título de exemplo, à Mata do Ramiscal.
É nos vales de orografia acidentada com vistas panorâmicas que se encontram turfeiras e bosques ripícolas; matas (tojais, urzais…) e rios; plantas como o freixo, o azevinho, o medronheiro e o pinheiro-silvestre, bem como uma grande diversidade de fauna, que tem no corço, no lobo-ibérico, na cabra-montês e nos garranos os seus maiores símbolos. E é também neste “refúgio” natural que existe um valioso património cultural e arquitetónico, entre mosteiros, pelourinhos, espigueiros, castelos, moinhos e barragens.
Mais de 1 milhão de visitantes desde 1996
O PN, maravilha natural que se prolonga por quase 70 mil hectares, atravessando as serras de Soajo, Amarela e Gerês, recebeu 1 262 000 visitantes entre 1996 e 2019, segundo os dados oficiais recentemente divulgados.